domingo, 31 de agosto de 2008

Assim vai o meu país

Acabaram-se as férias. Regresso a este país onde, como dizia o meu amigo Paulo Costa, “continuar a viver é um sinal de incrível resistência”. Ligo o telejornal para ouvir melhor as notícias que tinha escutado aqui e ali lá por fora: a situação no Cáucaso, as eleições americanas, o recrudescer dos atentados no Afeganistão. Em vez desses assuntos deparo-me com mais uma característica acção lusa: para combater a crescente criminalidade e insegurança que abala o país utiliza-se a acção policial em grande escala e devidamente noticiada com grande estrondo nos media. Hoje, as notícias das tvs eram as operações nos bairros problemáticos e nas estradas. Operações não dirigidas a alvos específicos, note-se. Cercaram as franjas dos bairros e toca de revistar pessoal, mandam parar os carros e sopra aí e deixa lá ver se levas um haxixe ou uma coca, mostra os documentos para ver se é roubado. Com isto, e como afirmava um responsável da polícia, pretende-se dar a “sensação de segurança às pessoas”. Não houve um ataque claro ao crime organizado, aos clãs e “redes”, muito menos à corrupção que vai alimentando o poder (será que o grande problema está nos “bairros problemáticos” ou nas máfias que neste país se reúne em hotéis de luxo e apartamento milionários?). Nada disso: disparou-se ao calhas para o meio de um bando de pássaros dos mais pequeninos que o objectivo não é acabar com a criminalidade, é apenas dar a “sensação” de segurança, contemos com a ajuda da televisão. Nem ouço falar de combater outro género de criminalidade que é que decorre do empobrecimento do país; do empobrecimento material e educativo. Pois faz sentido: se o que se pretende é apenas “dar a sensação” convém que o povo seja relativamente estúpido para não perceber o resto, a realidade. Os resultados de tão terrível acção nocturna de fim-de-semana que mobilizou um apreciável número de forças da ordem foi altamente positivo, como se referiu: uma pistola ilegal, outra também ilegal mas de imitação, uns rapazes que andavam a vender Haxixe, alguns condutores com excesso de álcool, outros com falta de documentos e destaca-se a impotante notícia (logo ao minuto quatro do telejornal da 1, o que revela a sua superior relevância no combate à criminalidade) da descoberta de seis raparigas brasileiras ilegais que andavam em casas duvidosas de Vila Viçosa e Borba. Uma foi mesmo detida e as outras notificadas. Ai as criminosas!
Já ninguém na Tv, ninguém nos jornais, jornalista ou analista, opinion-maker ou especialista, lembra outras medidas governativas na área. Por exemplo, aquela que dificulta a prisão preventiva.
Hoje, dia 31 de Agosto, o país fiou mais seguro e a criminalidade dificilmente se recomporá após este duro golpe.

sábado, 16 de agosto de 2008

A TV e os Jogos Olímpicos

Apenas um pequeno lamento de férias, ntes de partir para local mais aprazível que este belo país:
Desde criança que sigo atentamente os Jogos Olímpicos. Tinha somente sete anos quando o Mark Spitz ganhou as sete medalhas. Esse acontecimento, a par com a ideia de grande confusão que aconteceu em Munique quando decorria o ano d 1972, serão os acontecimentos desportivos mais antigos que guardo na memória.
Gosto de muitos desportos, se bem que tenha os meus preferidos: o futebol do meu Benfica em primeiro lugar, o ciclismo, o Atletismo. E, de um modo geral, todos os desportos colectivos: em particular o volei, mas também o Basquete e o Andebol.
Tudo isto para dizer que aguardo sempre as Olimpíadas com enorme interesse, pois posso não saber quem é o actual campeão mundial de Volei feminino, mas recordo sempre os sucessos da selecção cubana neste desporto, ou as olimpíadas onde as peruanas mostraram uma enorme alegria de jogo. São os momentos em que fico feliz à frente da televisão e me ponho a par do mundo do desporto. Em suma: gosto de fruir os Jogos Olímpicos.
Daí a minha desilusão deste ano. Estava à espera de poder seguir os jogos via TV, até porque agora dispunha de muitos canais… Erro tremendo de candura! A nossa RTP, seguindo a sua tendência degradante, passa umas coisinhas na RTP2, na 1 muito poucas, o grosso na RTPN, que é só para quem tem cabo, pois claro, que os outros não devem gostar de desporto, se querem paguem! Mas aquilo é volei de praia em monte, muito mais que o volei “verdadeiro”, esgrima em cagalhão, jogos de Andebol ainda não vi nenhum (será que isso é ir ao encontro do público?). Uma triste cobertura dos JO! Uma irritação para mim. E a sportTV, que nos cobra balúrdios, a transmitir, durante este período, jogos de rugby feminino de praia, a equipa do técnico contra outra faculdade qualquer, acho que veterinária. São estas as leis do mercado? Valha-me a eurosport, de borla para quem tem cabo, que é aquela que mais sintonizo nesta altura.
Entretanto começou outro evento que me enche as medidas: a volta a Portugal. Que a RTP aproveitou para acentuar a sua vocação pimba no programa “Hà volta” com a apresentação da estrela João Baião, e no qual podemos assistir ao que mais de piroso se vai fazendo neste país cuja economia apresenta, segundo a estatística e para felicidade dos analistas de pacotilha, resultados altamente positivos em contraciclo com a União Europeia.
Eu é que gosto de dizer mal e de me andar sempre a lamentar. Até quando tenho os Jogos Olímpicos para me distrair.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Medicina popular

Ele há coisas esquisitas. Aqui no snack-bar da Julinha, mesmo por baixo do Telhado do Gato Esteves, costuma vir uma personagem estranha e que defende métodos curativos raros, se bem que não comprovados. Contra a tendência geral do nutricionismo académico (e também da corrente mais empírica, tenho de concordar) centra a sua atenção nas preferências do utilizador (nome mais moderno de que paciente e cliente). Assim, e partindo da máxima “Para tratares do teu corpo, vai procurar ao porco”, a nossa Vercegina Maria Lúcia propôs-me tratar as complicações decorrentes dum tardio nascimento de um dente do siso (aos quarenta e sete, imagine-se) com um assado de bochechas de porco acompanhadas de batatas a murro (o Rochinha propôs igualmente um “Bom Juiz", de Reguengos, sugestão que em bom tempo acatei).
(….)
E não é que resultou! Acabou-se de novo, e milagrosamente, o siso.
Acrescentou-me a curandeira Vercegina algumas receitas práticas que aqui deixo aos interessados:
- uma boa feijoada feita a partir de cabeça de porco é um excelente antidepressivo, contribuindo também para um desenvolvimento da memória, graças ao fósforo, e para uma melhoria generalizada dos sistemas respiratório e digestivo nas suas partes superiores (e, reconhecidamente da parte mais inferior do último). Deve-se incluir sempre neste prato o chouriço para evitar os problemas de estômago que surgem sempre que se trata uma doença da cabeça.
- Para as dores de costas aponta-se como solução as costeletas grelhadas ou o lombo de porco no forno acompanhados com maçãs (para garantir uma boa garganta, problemas que costuma surgir nesta cura) e salada montanheira algarvia (em homenagem à terra da Vercegina).
- Para o pé boto e unhas encravadas, pezinhos de coentrada antecedidos, no caso do segundo mal, por uma entrada de percebes.
- males de ouvidos, a óbvia salada de orelha, se tomada com insistência, acaba por produzir os seus resultados.
- Iscas curam problemas hepáticos.
- problemas de sangue, chouriço preto.
- problemas de consciência derivados de pecados da carne, chouriço vermelho (nos casos mais graves, para exorcizar, o chouriço deve ser assado em lume vivo). Isto além, e como é claro, da tal feijoada que é vocacionada para todos os males de foro psíquico-psiquiátrico.
- lesões musculares ou do menisco, contraídas no perigoso mundo do desporto em geral ou do futebol em particular, são combatidas com ingestão maciça de presunto.
- o pernil de porco embeleza as pernas femininas e masculinas, tonificando-as e enrijecendo-as.
- um assento do carro feito em pele de porco previne as Hemorróidas.
- por fim, e por hoje, os problemas de impotência masculina são eficazmente combatidos por túbaros com ovos mexidos.
Acrescenta a Vercegina Maria Lúcia que está disponível para ser contactada, mediante a minha pessoa e de forma absolutamente gratuita, sobre outros e particulares males.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Lisboa e a Paisagem

Novas medidas para melhorar o ar em Lisboa: portagens mais pesadas para quem viaja sozinho, frota de transportes públicos a gás em vez de gasóleo. Boas medidas. Saudem-se. É que o ar em Lisboa parece que, por vezes, é muito poluído. Mas, doravante, pense-se duas vezes aquando do encerramento dos centros de saúde e das escolas na província; ou das reformas judiciais. O dinheiro que se poupa nessa altura é imediato. Mas a factura paga-se mais tarde. É sabido que a ânsia de destruição do interior não é boa para ninguém. Nem para a economia. E para perceber isto não é preciso ser-se muito inteligente.

O feito de Sócrates

Nos últimos anos tenho pensado em Portugal como um país do terceiro mundo. Pelo menos tem muitas características terceiro mundistas: a corrupção endémica com ramificações em todos os sectores do país, o funcionamento da justiça, a degradação da educação, a importância de líderes de clubes desportivos, a gestão das contas públicas com obras de fachada e comportamentos de novo-riquismo (veja-se o caso dos estádios do Euro) , a cunha, a bufaria.
Costumava dizer que Portugal era um país terceiro mundista com classe média. Essa afirmação ainda é váilida, mas temo que não o seja por muito mais tempo. Rapidamente conseguiremos assumir a nossa personalidade verdadeiramente terceiro mundista. Em breve conseguiremos aniquilar a classe média. Esse será o grande feito do regime. Conseguido pelos nossos gestores e grandes empresários, é certo. Mas quem colherá os louros, quem será reconhecido pelo feito, será o sr. engenheiro Sócrates.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

O sexo dos anjos

Anda a passar um anúncio muito giro na TV. É um fulano com asinhas (é essa a sua única aparência de anjo) que ataca as fêmeas assim de forma despudorada: um apalpão no rabo de uma moça que anda a fazer jogging nas ruas da cidade e, pronto, é só levá-la para o elevador e tufa-tufa; um convite a uma velha ricaça feito num camarote de uma ópera e, passado uns tempos, lá regressa a senhora a tirar uma pena da boca (imagem com complexa significação plástica). No fim, o senhor chega a casa, beija a mulher e abraça os filhos. Uma família feliz. E termina o anúncio com “E você: ainda pensa que os anjos não têm sexo?”. Acho o anúncio muito bom, todavia a pergunta deixada no final força-me a uma reflexão.
O suposto anjo é um homem. Esperava que um dia também aparecesse uma mulher. Mas parece que tal não irá acontecer. Bem sei que me dirão que os números da sida que estão a aumentar são os das mulheres heterossexuais. Mas deduzir a partir daí que elas contraem a doença porque os maridos andam a pular a cerca com senhoras já portadoras do HIV é uma conclusão que pode ser precipitada. Presume-se que são os maridos que andam a beber a água da fonte alheia, e não elas. Como se elas, elas sim, fossem os anjos. Esta postura, vinda de sectores que geralmente não o são, revela algum sexismo. É que as mulheres, tal como os homens, e se calhar tanto como eles, também poderão dar o seu pulo de cerca. Ou será que não? Afinal, quem é que pensa que os anjos têm sexo?

domingo, 3 de agosto de 2008

A Arte na província

O político, por natureza, gosta de ser popular. É o seu desígnio. É verdade que na história podemos encontrar políticos que foram generosos e que achavam que a sua ideologia, se levada à prática, contribuía para a melhoria da vida de todos. Mas esses são casos raros e, perdoem-me a desilusão, do passado. O político tem um objectivo: chegar ao poder. Em momentos da história chegava-se ao poder pela força ou pela intriga. Hoje, e por enquanto, chega-se ao poder pela popularidade expressa através do voto. E uma vez chegados ao poder, os políticos gostam de lá permanecer. E de deixar obra. A nossa história recente está cheia de casos destes, mais ou menos disfarçados, nem é preciso lembrá-los ou olhar para os presentes. E eu acrescento vários na política de província: no autarca das rotundas ou das megaobras, no presidente do conselho directivo que deixa orgulhosa obra na portaria ou no pátio sua escola. É a sua forma de combater a mortalidade: a obra.
Neste combate pelo deixar obra o político cruza-se com o artista. O artista também quer deixar obra. Se bem que para o “verdadeiro artista”, é a obra e não ele que deverá permanecer imortal. De qualquer modo os objectivos assemelham-se: é a rebelião humana contra a mortalidade.
Mas o político e o artista cruzam-se ainda noutro aspecto ligado à obra, que é o mecenato que o político gosta de exercer. O mecenato torna-o popular. Apoiar os artistas dá-lhe uma dimensão intelectual (o político tem de parecer intelectual) e contribui para a sua popularidade ao espalhar pelas cidades esculturas ou polémicas obras de arquitectura (o político adora as polémicas, a polémica trá-lo para a ribalta). Contudo existe um momento perigoso para o político: o momento em que o artista ofusca em popularidade o político e o político fica com ciúmes. Acredito até que em muitos casos isso aconteça de forma inconsciente. A história do mecenato italiano do Renascimento é um caso evidente desse perigo e que atormenta qualquer político que a estude (não sou assim tão pessimista e acredito que ainda haverá alguns políticos que conhecem um pouco de história). Esta situação é ainda mais evidente na política de província: é fácil um artista local suplantar em popularidade o presidente da câmara. Por isso a arte e a cultura encontram dificuldade em florescer na província. Além disso há um outro fenómeno bem conhecido do político e em relação ao qual ele se tem que precaver: o artista é, por definição, um livre-pensador. E, como tal, gosta de fazer como o cão que morde a mão de quem lhe dá de comer. Por isso, o natural casamento entre o artista e o político é um casamento que, muitas vezes, acaba mal. Culpa dos ciúmes, como em tantos outros casamentos.