sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Resposta ao triste post (todos têm direito a esses momentos) que me antecede.

Confesso que fiquei deveras preocupado com o último post do Fernando Évora. Uma triste lamentação que não augura nada de bom, antes uma depressãozita que deriva num desnorte inexplicável em tão racional ser. Obrigavam-me os deveres da longa amizade que temos a retorná-lo ao caminho certo. A abrir-lhe os olhos, tirá-lo daquela turvez de pensamento. Não o pretendia fazer aqui, publicamente. Esperei por ele durante toda a semana no snack-bar da Julinha, ali debaixo daquele que um dia foi o telhado do gato Esteves. Em vão. Pelos vistos esta angústia existencial que perpassa a sociedade portuguesa e na qual ele se deixou embalar levou-o para longe deste antro. Foi pena. Vejo-me, pois, sem outra alternativa do que lhe chamar à razão nesta “blogosfera”, local mais frio, além de que público, do que como esperaria: naquela mesa lá do fundo defronte duma cervejinha, ou do gin tónico que ele tanto aprecia. Ainda pensei fazer um simples comentário. Mas tive medo de passar demasiado despercebido e optei por esta via mais espampanante.
A razão da minha apreensão é simples: o rapaz ainda acredita na democracia! Ainda acredita que este sistema pode trazer a solução ao mundo que se vai degradando em desfavor dos pobres e dos remediados, alimentando a avidez (até o Sócrates se descuidou e falou de “ganância”, ele que até dessa forma pareceu um menino de coro cheio de boas intenções para com os pobrezinhos) dos grandes. Até o Marx, que não era propriamente um suprasumo (super-sumo como diria o Luís Filipe Vieira) da inteligência, tinha previsto isto há um porradão de anos. É apenas a avidez do grande capital a chupar o tutano da malta (o Zeca diria, naquela bela canção que juntos cantámos numa fogueira da Fuzeta, os vampiros a chupar o sangue da manada). E o Fernando Évora, desiludido por não encontrar um partidozeco defensor daquela linha meia-tinta que deixa o capitalismo avançar mas que dá o remedeio suficiente para pão e circo aos pobres, declara assim publicamente: eu até votei nestes gajos que estão no poder (ou seja: na pior direita que governa o país desde o 25 de Abril), mas fui enganado pela ideologia, promessas e tal, e agora vou votar (ou voltar a votar) na esquerda tradicionalista. Óh rapaz, isto está mais que visto. Não é só o sistema capitalista (é melhor chamar-lhe mesmo liberal) que está a dar o berro numa crise financeira. Essa crise é uma repetição da outra de 29. É a própria democracia, que criou as condições para o triunfo dessa minoria que ganha com o liberalismo, que falhou. Isto não é o poder do povo. Os partidos não têm ideologia. São apenas o veículo para o grande capital controlar o poder político. E para isto já não há solução. A única solução é mesmo a Revolução Mundial, com muito sangue a jorrar. Lamento dizê-lo, pois isso fere a minha anterior existência e desejo de viver num mundo hippie, à volta duma fogueira (que bom seria que a fogueira da Fuzeta fosse a fogueira eterna) com guitarras, flores no cabelo e uns cigarrinhos de erva a rodar. Mas chegámos a um ponto de não retorno. É que com a queda do muro de Berlim estes capitalistas perderam todo o pudor. Mas estão condenados ao fracasso, pois a sua avidez leva-os a tudo perder. Nós, e os nossos filhos e os que atrás de nós e deles vierem) apenas vamos arrastados nessa fantástica asneira que desafia qualquer racionalismo de qualquer ciência social..
E tenho dito, pá. Aparece aqui pelo snack-bar da Julinha que eu te explico melhor se for preciso (não será, que tu és um rapazola inteligente e bem intencionado; mas aparece só pelo prazer da companhia de um copo, que sei que aprecias tanto como eu).

sábado, 20 de setembro de 2008

O Sr. Alberto João, os 20% de "comunas" e um arrependimento pessoal.

O senhor Alberto João Jardim mostrou-se espantado por 20% dos portuguese manifestarem intenção de votar comunista nas próximas eleições, chamando "comunistas" ao tradicional PC (mascarado de CDU) mais o Bloco de Esquerda. E acrescentou que tal seria insólito na Europa. Mas mais: considerou que os direitos dos trabalhadores portugueses continuam a ser "violados" perante o encolher de ombros de uma burguesia "inculta".
Goste-se ou não do Sr. Alberto João, ele está cheio de razão, embora desta vez só tenha constatado o óbvio para grande parte dos portugueses. Com este discurso, e ao afirmar que os direitos laborais estão a ser "violados", mostrou que afinal tinha um princípio social-democrata (pelo menos ideologicamente, já que no que respeita a liberdade de opinião a Madeira apresenta alguns problemas). Estranho? Não me parece, já que o que aconteceu nos últimos anos é que este PS virou tanto à direita que um personagem como o Alberto João está claramente à sua esquerda. Veja-se o facto da aplicação parcial da avaliação de professores na Madeira: avaliação sim senhor, mas sem quotas, quem merecer sobe, quem não merecer não sobe. Não é um bom modelo de avaliação, mas é uma fórmula bem mais justa e, sobretudo, sensata.
Hoje mesmo, na "rentrée" do PS, o 1º ministro apareceu em mangas de camisa a dizer que era de esquerda. Chego a pensar que a sua ignorãncia é tamanha que chega mesmo a pensar que é de esquerda porque não usa gravata e é pela despenalização do aborto, ou simplesmente porque o seu partido tem "socialista" no nome. Fez um discurso inflamado com vagas influências chavezianas. Mas isso não lhe tira o facto de nos últimos anos a vida ter piorado, a precariedade se ter transformado em regra e os lucros das empresas ligadas ao grande capital aumentado. Foi, sem dúvida, uma política de direita, a mais à direita que alguma vez houve em Portugal, capaz de despertar em Paulo Portas uma descontrolada e sentida inveja (nota-se na postura uma pontinha de depressão por ter perdido o seu espaço).
Devo dizer, e com isto dou a razão e a explicação ao sr. Alberto João, que nas últimas eleições votei no PS. Aquando da determinada luta deste governo contra os professores (o seu ódio aos professores levou a que esta luta tivesse descambado numa luta contra a educação em geral) fui várias vezes, pelo sr. primeiro-ministro e pelos analistas em geral, apelidado de "comunista". Isso de quem contestava a ministra da educação eram os comunistas, ou então manobrados por esses espíritos maquiavélicos sempre a perturbar o normal funcionamento das instituições democráticas, sempre a quererem pôr um pedrinha na engrenagem. Esta ideia manteve-se até à célebre manifestação de 8 de Março, com cem mil "comunas" (para usar o termo tão do agrado de Alberto João) nas ruas. O "Expresso" desse mesmo dia, e com a tradicional falta de sensibilidade jornalística, trazia uma crónica de Fernando Madrinha a reafirmar a ideia de comunistas a salivar ódios e a semear a violência que marchavam pelas ruas de Lisboa, uma outra crónica com as parvoíces brejeiras do Miguel Sousa Tavares e uma extensa entrevista com a Ministra da Educação; o sr. Emídio Rangel apelidava-nos então de hooligans. Depois desse dia deixaram de nos chamar comunistas, se calhar por sermos tantos, se calhar porque esses opinion makers, analistas e especialistas começaram a ver que tínhamos razão, era racionalmete incontornável. Mas desde esse dia que eu fiquei com a certeza que nas próximas eleições estaria cá do lado da esquerda, desses partidos que, dizem os entendidos, não são partidos de poder. E então quem são os partidos de poder? São os partidos do poder económico que nos conduziram a esta situação. Porque os outros partidos servem afinal um status quo de lucros escandalosos das grandes empresas enquanto nós, força de trabalho, temos de trabalhar mais por menos, sujeitar-nos a deslocalizações e flexibilizações do horário de trabalho porque esses são os mesmos desígnios da economia que permitem aos grandes gestores auferirem chorudos prémios de desempenho, comprar McClarens de mais de quinhentos mil euros, viver em condomínios de luxo fechados ao mundo exterior e á criminalidade violenta que com a sua vivência estimulam sem saber. Não acredito nessas inevitabilidades da economia. Portanto, senhor Alberto João, qual o espanto de sermos 20%? E se não houvesse o controlo que há sobre a comunicação social e a tentativa de se continuar a criar um povo ignorante, seríamos muito mais. Como seremos.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Menos Estado, Melhor Estado?

Recebi, de fonte fidedigna, o seguinte programa de festas do dia 15 de Setembro, dia em que se iniciaram a maior parte das actividades docentes. Até onde ainda tive força para o comprovar, estava todo muito certinho:
"Programa:
10h30 - Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho (Paulo Campos, secretário de Estado das Obras Públicas) - FIGUEIRA DA FOZ
Escola Profissional de Desenvolvimento Rural do Rodo (Jaime Silva,
Ministro da Agricultura) - PESO DA RÉGUA

11h - Escola Secundária José Gomes Ferreira (José Sócrates, Primeiro-Ministro, e Valter Lemos, secretário de Estado da Educação) - LISBOA
Escola Portuguesa de Moçambique (Augusto Santos Silva, Ministro dos Assuntos Parlamentares) - MAPUTO
Escola Secundária Almeida Garrett (Maria de Lurdes Rodrigues, Ministra da Educação) - VILA NOVA DE GAIA

14h30 - Escola Profissional de Desenvolvimento Rural de Serpa (Rui Sá Gomes, secretário de Estado da Administração Interna) - SERPA .

15h - Escola Secundária Tomás Cabreira (Jorge Pedreira, secretário de Estado Adjunto e da Educação) - FARO
Escola Secundária de Amarante (Maria de Lurdes Rodrigues, Ministra da Educação) - AMARANTE
Escola Secundária Miguel Torga (Paula Fernandes dos Santos, secretária de Estado da Cultura) - BRAGANÇA
Escola Secundária Dom Manuel Martins (Bernardo Trindade, secretário de Estado do Turismo) - SETÚBAL
Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro (Alberto Costa, Ministro da Justiça) - CALDAS DA RAÍNHA.
Escola Secundária José Estevão (Maria Leitão Marques, secretária de Estado da Modernização Administrativa) - AVEIRO

15h30 - Escola Secundária de Gouveia (Eduardo Cabrita, secretário de Estado Adjunto e da Administração Local) - GOUVEIA
Escola Secundária S. Pedro do Sul (Mário Lino, Ministro das Obras Públicas) - SÃO PEDRO DO SUL
Escola Secundária Alberto Sampaio (António Braga, secretário de Estado das Comunidades Portuguesas) - BRAGA
Escola Secundária do Pombal (José Miguel Medeiros, secretário de Estado da Proteção Civil) - POMBAL

16h - Escola SecundáriaNun'Álvares (Gonçalo Castilho, secretário de Estado da Administração Pública) - CASTELO BRANCO
Escola Secundária com 3.º Ciclo de Estremoz (Francisco Nunes Correia, Ministro do Ambiente) - ESTREMOZ
Escola Secundária Júlio Martins (Ascenso Simões, secretário de Estado da Protecção Civil) - CHAVES
Escola Secundária da Lourinhã, (Ana Jorge, Ministra da Saúde) - Lourinhã

18h - Escola Secundária Artur Gonçalves (Vieira da Silva, Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social) - TORRES NOVAS
Escola Secundária de Ponte de Lima (Luís Amado, Ministro dos Negócios Estrangeiros) - PONTE DE LIMA

19h - Escola Básica e Secundária de Alter do Chão + Escola Profissional de Alter do Chão (Filipe Batista, secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro) - ALTER DO CHÃO."
E ocorreu-me perguntar: então não havia a promessa de "menos Estado/melhor Estado"? De poupança dos dinheiros do nosso orçamento? Ou isso é só para os malandros dos funcionários públicos? Estas deslocações às escolas em quanto é que importam para o erário público? Quanto dinheiro é gasto nestas deslocações em ajudas de custo aos senhores governantes e suas comitivas consumistas de beberetes e flores? O que fica por fazer nas escolas quando se gasta tanta energia nas recepções condignas a estes senhores? Ou será que estou a exagerar? Será que tanta deslocação é mesmo boa para a nossa educação? Será que há tanto jornalista para cobrir isto tudo e daí colher benefícios indirectos (não sei muito bem do quê)? Porque será que mais ninguém fala neste exagero?

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Recordações do ciclo preparatório.

Hoje foi o primeiro dia de aulas da minha filha como aluna do 5º ano. Mudou, pois, de escola e de sistema. Terá sido um dia importate na sua carreira de aluna.
Evoco - ando muito evocativo, deve ser do Outono -, os tempos em que também eu passei para o 2º ciclo. Na altura dizia-se 1º ano do Ciclo Preparatório. Estávamos em Outubro de 1975, porque então as aulas começavam em Outubro e não em Setembro, como agora. E no início do ano lectivo a maioria dos professores ainda não tinham sido colocados. Havia, por isso, muitos “furos”, mas nós preferíamos o nome menos contaminado de “feriados”. E quando tínhamos feriado não havia aulas de substituição. Lá ficávamos nós perante os perigos das crianças sozinhas e entregues a si próprias: jogávamos futebol, brincávamos as escondidas, a apanhada, ao mata, jogávamos ao berlinde (fiquei sem nenhum: perdi-os todos ao perde-paga) saíamos livremente da escola sem o ocultar a ninguém e íamos comprar rebuçados, chocolates, bolos atascados em creme e outras porcarias a uma vendedora ambulante (Dona Adélia?) ou a um café estilo tasca que ficava ali perto (hoje a ASAE já o teria fechado, tal como a Associação de Pais teria expulso a Dona Adélia); alguns de nós bebiam uma laranjada, uma gasosa, um fruto real; partilhávamos as bebidas com os colegas e amigos; confesso mesmo que, pela calada, chegámos a comprar um maço de tabaco (marca Ritz) entre todos os rapazes da turma e fumámos o maço durante um feriado (era sempre a despachar, ninguém queria levar o maço de tabaco para casa). Os feriados eram tantos que tivemos que inventar histórias e brincávamos as Revoluções (havia o MFA e os fascistas, eu fazia de almirante Rosa Coutinho pois nessa altura queria ser marinheiro), as guerras (que eram os alemães contra os aliados, eu gostava de fazer de um capitão que estava preso dos alemães e cujo nome começava por K, não me lembro agora, era uma série que dava a noite), aos jogos de mímica (havia um concurso na TV de mímica), mais tarde a vaca Cornélia, realizámos eleições e manifestações. Tudo na brincadeira. Alguns dos mais velhos de nós já se atiçavam nas brincadeiras com as moças (era uma experiência nova, a minha escola primária tinha sido só de meninos); também frequentávamos a Biblioteca onde líamos livros dos cinco e dos sete (e outras coisas, lembro-me que no meu segundo ano do ciclo fui lendo, inteirinho, o Ivanhoe do Walter Scott na biblioteca do meu ciclo). Cresci e aprendi muito com os meus amigos nesses feriados. Fui-me moldando naquilo que sou hoje. Nos feriados e nas aulas, que me lembro muito bem de algumas das aulas que tive no ciclo. Lembro-me de uma aula de Português do 1º ano (actual 5º) onde analisámos o Guernica; uma outra onde escutámos o “operário em construção” (no 2º); das aulas de Estudos Sociais, das de Músca (a professora era muito disciplinadora, a Carlota), de fazer BD em Desenho, de como adorei a esmirna em trabalhos manuais. Mas, repito: fui moldado pelas aulas e pelos feriados. Estes ensinaram-me a ser solidário, a aceitar a derrota, a fazer amigos e companheiros; estimularam-me a imaginação; ajudaram-me a descarregar a minha energia e fantasia de criança.
Penso na minha filha. Ela já não terá os meus feriados. Cada falta, uma aula de substituição. Saberão que sou professor e poderão pensar: “O gajo está para aqui com esta conversa mas não quer é fazer aulas de substituição; não quer trabalhar que é o que os professores antigamente não faziam, sempre a faltar, com montes de férias. Esta ministra é que os pôs na ordem!” (outros julgar-me-ão apenas um bacoco saudosista). Acreditem-me que não é esse o meu fito. Acredito sinceramente que as crianças precisam de liberdade, que devem estar juntas sem adultos por perto, perante os perigos de ficarem entregues a si mesmas. Acho até que é na falta dos feriados que reside uma porção da explicação do seu comportamento ter +piorado tanto nos últimos anos. As crianças de hoje não sabem estar sozinhas, não sabem o que fazer se não receberem ordens ou conselhos em algum sentido. Transformar-se-ão em adultos obedientes e não-pensantes, seres amorfos dispostos a receber ordens. E aí estarão, finalmente, atingidos os objectivos desta política educativa.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Uma rebuscada estupidez

Esta tarde, ao regressar do trabalho, ia escutando as notícias da Antena 1 quando soube de um senhor que tinha sido baleado no interior de uma esquadra da polícia de Portimão. Depois, e no desenvolvimento da referida notícia, aquela estação de rádio transmitiu as sábias palavras do ministro da tutela, Rui Silva Pereira.
Confesso que fiquei confuso com a estranha analogia que o senhor ministro foi desencantar. Tomou-me inclusivamente uma sensação de incredulidade mas depois lembrei-me de Mário Lino e Manuel Pinho e voltei a confiar nos meus sentidos: ele devia mesmo ter dito aquilo que eu tinha ouvido.
Chegado a casa quis ouvir o Telejornal. Da notícia de Portimão, sim senhor, um homem baleado. Mas das sábias palavras de Rui Silva Pereira, népia. Foi então que vim à net e ainda apanhei parte dessas palavras no iol (o censor estaria a jantar e deixou passar?). Não eram todas as palavras do insigne magistrado, mas estava lá o essencial e fiz um copy/paste que estas notícias tendem a desaparecer depressa. Aqui fica um excerto para não julgarem que invento:

O ministro da Administração Interna comparou esta terça-feira o caso do baleado numa esquadra de Portimão com o homicídio de Lee Harvey Oswald, o susposto (sic) assassino de John F. Kenney (sic), à entrada para a sala de tribunal.
«Como sabem Lee Harvey Oswald foi baleado mortalmente no tribunal quando estava acompanhado por dezenas de polícias do FBI»,


Quase que não valeria a pena fazer qualquer comentário tal o surrealismo da comparação dos casos, certamente dignos de uma análise do foro psicanalítico. Rui Silva Pereira acha portanto normal que se seja baleado numa esquadra da polícia de Portimão quando situação semelhante aconteceu num tribunal há 45 anos nos supostamente seguros Estados Unidos da América, exemplo máximo de eficácia policial, na sequência do assassinato de um Presidente. Claro que não lhe interessa o misterioso contexto deste assassinato americano e as suspeitas mais do que fundadas de que a morte de Lee Oswald resultou da acção da própria polícia secreta americana, a CIA ou mesmo o próprio… FBI (que o protegia). O intricado daquela situação e o momento americano de então estão longe de poderem ser dados como elementos de referência de segurança pois nos anos seguintes continuou o assassinato do clã Kennedy e de outros “perigosos” americanos como Martin Luther King ou Malcolm X. Mais à frente na notícia e para que não subsistam dúvidas sobre a capacidade analítica do ministro:
Na comparação, Rui Pereira explicou o que queria dizer quando recordou este pedaço da História norte-americana: «O que eu queria dizer é que não é normal o que aconteceu na esquadra de Portimão, mas não prova a ineficácia da acção policial».”
Oh, senhor ministro: então um homem baleado no interior duma esquadra não prova ineficácia policial? Isto não é coisa nova, sr. ministro, já aconteceram coisas semelhantes há bem pouco tempo nas nossas esquadras policiais. Claro que não houve eficácia policial, sr. ministro. Vá dizê-lo ao senhor que foi baleado: “eh, pá, estás a ver que a ti aconteceu-te o mesmo que ao Lee Oswald há 45 anos atrás e nos Estados Unidos da América. Azar o teu …”Como certamente não esteve bem a polícia norte-americana que deixou matar (ou matou) o Lee Oswald. Lá por ter acontecido nos States não quer dizer que a polícia seja a melhor do mundo.
A comparação de Rui Silva Pereira é uma rebuscada estupidez. A menos que o Sr. quisesse ir mais longe na sua comparação e pretendesse traçar um paralelo entre o Portugal mafioso de hoje com a América mafiosa dos anos sessenta (para o que parece concomitar a estranha ausência de referência dos órgãos de comunicação social às palavras do ministro). Mas mesmo assim… Continuar a demonstrar a estupidez desta analogia parece-me ser claramente um insulto à inteligência dos leitores deste blogue. Estamos perante um ministro na linha Lino-Pinho, mas mais dado à história norte-amercana, que não deve ter estudado bem.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

A propósito dos assaltos

Desde sempre o crime exerceu sobre mim um grande fascínio, como alguns leitores mais atentos compreenderão. Trata-se da minha costela anarquista e da sedução Robin dos Bosques (não confundir com a apropriação, cheia de falsidade, deste herói pelo governo). Na minha adolescência desejei mesmo vir a ser um Clyde Barrow na América da Depressão. As semelhanças entre aquele momento e os de agora são flagrantes. Mas faltou-me sempre a coragem determinante para enveredar pelo mundo do assaltante de bancos (ou terá sido, quiçá, por nunca ter encontrado a minha Bonnie) e o máximo que fiz em termos de roubo foi fugir duns bares e discotecas sem pagar a conta. Mas nunca deixei de sentir uma pontinha de solidariedade pelo ladrão de bancos. Torço por ele, do mesmo modo que torço pelo touro na tourada. Tanto numa como noutra torcida, são raras as vezes que a minha equipa ganha. Compreendam-me: a dúvida sobre o maior dos ladrões é evidente: o assaltante ou o banco propriamente dito?
Vem isto a propósito do aumento da criminalidade no país. Os motivos são evidentes e por certo não se prenderão com o desempenho económico altamente positivo do governo, nem com o hercúleo esforço realizado pelo mesmo no campo da educação. Outro colaborador deste blogue insinuou que o sinal havia sido dado com as dificuldades criadas na prisão preventiva. Soube hoje que Portugal é o país da União Europeia com menos presos preventivos (o que será mais um motivo de orgulho para a obra legislativa deste governo). Mas também temos que juntar a isto o interesse das “oportunidades de negócio”, de que me falou o Luís Bonito num mail. Claro: tudo são oportunidades de negócio. Lembra-me a triste história da aplicação da pena de morte na cadeira eléctrica nos EUA ter sido conseguida pela pressão de duas empresas concorrentes de electricidade. Então como agora, dominava no mundo este Liberalismo desenfreado e desumano que até na morte vê uma oportunidade de negócio.
Ladrões maus roubam as bombas de gasolina (quando as gasolineiras aumentam os preços perante a baixa do petróleo: afinal quem é o maior ladrão?). É claro que não roubam directamente as gasolineiras. Os revendedores que se orientem e as empresas de segurança que aproveitem a "oportunidade de negócio". Tudo isto é absolutamente ridículo. E para mudar vai ser preciso sangue. Que não falte então a coragem.