sábado, 23 de maio de 2009

O fim do pudor

Não sou suficientemente ingénuo para pensar que os eleitores se preocupam com as grandes discussões políticas ou ideológicas antes do voto. Imagino que votem de forma mais tradicional a pensar "estes tipos são uns malandros" até ao dia em que, vendo os anos a passar, deixam de ter a preocupação de se deslocarem à mesa de voto. Claro que haverá os mais calculistas que têm cartão de partido, ou que são pressionados por quem o tenha, ou que estão dependentes de um emprego na câmara ou de alguma licença de construção ou esperançados em verem resolvidos os seus problemas com os esgotos. E este facto explicará porque a abstenção é maior nas europeias e menor nas autárquicas. Mas esses são a minoria e poderíamos chamar-lhes os "cidadãos motivados e interventivos". O resto não quer saber se deve haver mais ou menos mercado, se a regulação funciona bem ou mal, se o Paulo Rangel é bom candidato, sequer o nome do ministro da economia ou de outro qualquer, ou mesmo se o desemprego é 8 ou 10%. E, consequentemente, está-se nas tintas para saber se o Lopes da Mota se deve ou não demitir. Creio igualmente que os partidos não embarcam nessas ingenuidades. O PS ou o PSD sabem muito bem que três quartos dos portugueses não distingue o Lopes da Mota do Vítor Constâncio. Sabem que tudo se joga na propaganda, e nesse particular o PS leva grande vantagem.
Todavia, e apesar destes factos não interessarem aos portugueses, e até se poder argumentar com presunções de inocência até ao transitar em julgado, havia antes uma réstia de princípio na democracia (como convencionou chamar-se a este regime) a que chamarei de "pudor". Podia valer muito poucos votos, mas uma espécie de vergonha perante quem fazia uma asneira destas à Lopes da Mota que fere todos os princípios da ética - até da ética política mais aproximada ao niilismo - que o levava a demitir-se, ou a ser demitido, em vez de andar para aqui a boiar como se nada se passasse. O caso "Lopes da Mota" é apenas mais um do sistema português (o tal que de democracia começa apenas a ter o nome); mas este caso vira uma págiina neste sistema que perde o "pudor" perante a indiferença e o encolher de ombros dos eleitores.
Sócrates diverte-se ao manter o amigo Lopes da Mota no Eurojust e, certamente, ri-se. E esse riso traz verdade ao adjectivo com que os alunos da António Arroyo (manobrados por essa corja que são os professores?) o apelidaram no dia de hoje.

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