domingo, 20 de abril de 2008

O "Massacre de Lisboa"

Passa agora mais um aniversário sobre o “massacre de Lisboa”, também conhecido por “matança da Páscoa”, nome mais condicente com a desumanidade a que se assistiu, e que agora evoco por o considerar merecedor da nossa reflexão.
Passo a sintetizar os factos (socorro-me, para isso da «Chronica do Felicissimo Rey D. Manuel da Gloriosa Memória» e de mais algumas referências historiográficas que poderei disponibilizar aos mais interessados no tema): a 19 de Abril de 1506, um domingo de Páscoa, numa missa, o povo de Lisboa julga ver a imagem de Cristo reflectida no altar- Milagre! Milagre!. Mas logo um cristão-novo (antigo judeu convertido – provavelmente à força-- ao cristianismo), imbuído de racionalismo diz tratar-se apenas de um reflexo do sol.
É este o suposto (e verosímil) ponto de partida para a “matança da Páscoa” em que cerca de 3000 ex-judeus foram torturados e barbaramente assassinados por uma populaça em fúria que os acusava de serem os principais responsáveis pela fome e peste que grassava então no país. Um acto de xenofobia da época de tristes causas e consequências.
Foi em 1506. Apenas 8 anos depois de Vasco da Gama ter aportado a Calecute, 6 depois da Descoberta “oficial” do Brasil. Aconteceu, portanto, no dealbar da era moderna e do glorioso período da expansão portuguesa. Que não terá afinal sido assim tão glorioso. Período de seca, peste, ódio religioso impregnado nas massas populares que haveria de conduzir á trágica instauração da inquisição em Portugal três décadas depois.
Os pontos para reflexão são muito muitos mas permito-me seleccionar um: os novos tempos do século XVI, modernos económica, científica e até culturalmente (entendendo-se aqui quantidade/qualidade de produção literária e artística) trouxeram também consigo a intolerância e a semente da futura estagnação. Relembro os efeitos da Inquisição no ser português (ninguém me tira da ideia que ela é gérmen deste gosto pela bufaria e a bajulação que mina o país). É este o tema – permitam-me a publicidade – do meu conto “A fonte de Mafamede” (colibri, 2002): nem sempre novos e supostos melhores tempos o são de facto; muitas vezes escondem a intolerância, o ódio, o pior do ser humano (acrescento ainda a eventuais leitores do dito conto, que o mesmo foi escrito nos dias que se seguiram ao 11 de Setembro).
Será que o tema “massacre de Lisboa”, ocorrido em 1506, é actual?

Sem comentários: